FUTEBOL E PANDEMIA

Nestes tempos em que vivemos, já percebemos que a prioridade das nossas vidas deverá ser, sem sombra de dúvidas, a saúde da nossa espécie. Claro está que a matriz de prioridades em que cada um de nós se apoiava para organizar a sua vida foi alterada, de uma forma completamente inesperada, deixámos de ter uma matriz consolidada e passamos a ter a necessidade de, à bom português, conseguirmos tomar decisões de uma forma muito mais espontânea e rápida. A vida passou a ser “um dia de cada vez”. Quem me conhece sabe que sempre fui apologista do planeamento em tudo o que faço, no entanto vi-me na circunstância de não conseguir elaborar os planos de que tanto gosto.

Um dos projetos que abracei há cerca de 4 anos foi o Clube de Futebol “Os Marialvas”, continua a ser um projeto que ocupa uma parte do meu plano diário (sim, agora os planos são só diários) e que me tem exigido uma capacidade de abstração acima do que estava habituado, na prática tem sido um exercício de planear quase no vazio!

Neste momento, uma das questões que mais me colocam é “quando é que começa a bola?” Pois bem, a minha resposta, infelizmente, tem sido “ainda não se sabe”. Esta resposta, ao contrário do que se possa julgar não é tão negativa como isso. Digo isto porque, na minha perspetiva, a ausência de decisões abre-nos a hipótese de múltiplas conclusões, ou seja, tudo poderá ser possibilidade.

A realidade em que vivemos, tendo que lidar com a COVID19, é hoje uma realidade que deverá ser considerada como uma oportunidade. Uma oportunidade para repensarmos o nosso posicionamento geral perante todos os vetores que norteiam a nossa vida. No que ao futebol diz respeito, tenho uma opinião que, provavelmente, não será consensual, mas que julgo será a que nos permitirá uma melhor preparação para o que o futuro nos reserva.

Segundo a OMS o controlo total sobre o SARSCorv 2 só será atingido num prazo de cerca de 2 anos, pois bem, não será esta altura um bom momento para “abrandarmos” um pouco o nosso quotidiano de forma a prepararmos esse “regresso” à normalidade? Julgo que sim! Bem sei que o que vou explanar de seguida também tem alguns aspectos pouco positivos mas na balança do que gostaríamos vs o que conseguimos concretizar continua a ser necessário criar um ponto de equilíbrio.

 Vamos ao que interessa!

Na minha opinião, tendo em conta o índice, ainda elevado, de incertezas ao nível da garantia da segurança sanitária da comunidade, o futebol amador tem uma oportunidade de fazer uma “pausa sabática” e reorganizar-se de forma a preparar um potencial regresso em grande!

Todos sabemos as dificuldades extremas que os clubes amadores passam, quer ao nível financeiro, quer a outros níveis. Sabemos também que as circunstâncias atuais vieram aumentar exponencialmente esses constrangimentos e por isso mesmo, os clubes vivem hoje numa encruzilhada. Hoje os clubes não sabem como fazer, não sabem como organizar, não sabem como encontrar soluções, não sabem como sobreviver.

Como ditam as boas práticas do planeamento, vamos dividir um problema grande em dois mais pequenos. No futebol, podemos dividir a vida competitiva de um clube em dois grandes pilares, o futebol sénior e o futebol de formação.

A MINHA OPINIÃO

CLUBE DE FUTEBOL
 SENIORESFORMAÇÃO
DISTRITAL / AMADORPausa de pelo menos 1 época desportivaPausa de pelo menos 1  época desportiva
NACIONAL (FPF)Competição com maior controlo FPF (º)Competição com maior controlo FPF (º)
  • Adaptação de actuais regulamentos de forma a garantir um apoio muito mais efectivo e substancial aos clubes presentes nestas competições. As alterações em causa deveriam ser elaboradas de forma a garantir índices de segurança sanitária, para a comunidade desportiva e não desportiva) acima dos mínimos e desta forma preparar o terreno para o futebol amador na época seguinte. O apoio da FPF deveria ser financeiro, claro está, mas também de cariz logístico e organizativo.

Este quadro, julgo eu, é suficientemente esclarecedor, de qual é a minha posição em relação a esta questão, no entanto, há outros fatores que também deverão ser tidos em conta, pois, o futebol, enquanto fenómeno social, vai muito mais além disto. Não esqueçamos que as centenas de milhar de atletas jovens que pratica desporto, nomeadamente futebol, verão a sua necessidade de prática desportiva coartada, mas pergunto eu: Não será isso menos mau do que uma situação de descontrolo em relação à COVID19?

Este poderá ser o momento para os clubes e os seus directores serem criativos ao ponto de criarem soluções alternativas, disponibilizar novas modalidades, fomentar outra forma de se encarar a prática desportiva…

Outra variante deste problema centra-se nos quadros de recursos humanos do clubes, mas em relação a isso minha opinião é muito clara: “conceptualmente falando, qual a diferença entre os treinadores que poderão perder a sua fonte de rendimento e os trabalhadores que já hoje vivem essa realidade?” – Bem sei que poderei estar a ser frio e insensível, mas a vida cada vez mais nos ensina que não serão os mais fortes a sobreviver, mas sim os que se conseguirem adaptar melhor!

Como tenho vindo a defender de há uns tempos a esta parte os clubes têm que começar a olhar mais para o lado e menos para cima ou para baixo. Os clubes têm cada vez mais que olhar para os seus pares, têm que cada vez mais olhar para os que sofrem as mesmas dores, tem que cada vez mais perceberem que só unidos serão uma força viva com capacidade de promover a tomada de decisões e tomarem eles próprias decisões com impacto nas comunidades onde estão inseridos!

Tudo isto é muito fácil de colocar no papel, difícil seria colocar na prática. Digo “seria”, pois, tenho a “consciência” que estas minhas opiniões não colhem junto da esmagadora maioria da comunidade desportiva/directiva.

Enquanto responsável por um clube desportivo com forte incidência na modalidade de futebol, devo dizer que, mesmo esta opinião não está fechada pois, como disse anteriormente, os planos agora são só diários, mas, também não posso deixar de o dizer, tem-me chocado a forma como alguns dirigentes têm gerido esta situação! Não consigo compreender que se queiram começar competições a “todo e qualquer custo”, não consigo compreender que não se tenha a preocupação máxima de garantir níveis de segurança mínimos para a retoma das competições!

A este nível não posso deixar de frisar a posição das múltiplas Associações de Futebol Distritais que têm sido apenas e só os “cães de fila” da FPF no sentido de pressionar a DGS a tomar decisões! Como se podem marcar datas de inicio de competições com normas da DGS por definir?! Bem sei que a posição das Associações em causa é muito complicada e com muito pouca autonomia, mas convenhamos que a inércia de algumas começa a ser difícil de aceitar, pelo menos façam cumprir, junto dos vossos filiados, as normas que estão em vigor!!!

Não ficamos por aqui, não nos podemos esquecer de outras entidades que são verdadeiros parceiros estratégicos dos clubes amadores (principalmente) que lutam hoje pela sua sobrevivência.

Os Municípios terão que ser pedra basilar na identificação e construção de soluções.

Os Municípios terão de ser parte ativa e serem catalisadores de sinergias que permitam chegar a soluções de consenso. Não podem continuar a colocar a cabeça na areia ou continuar a justificar a sua inércia, quase total, com a existência de uma pandemia e com a existência de outras prioridades.

Todos juntos teremos que ser mais “profissionais”!

Todos juntos teremos que ter a capacidade de ver um pouco além do nosso nariz!

Todos juntos teremos que ter a capacidade de fugir da solução mais imediata, e com menos longevidade!

Todos juntos teremos que apostar clara e inequivocamente nas soluções mais difíceis, mas de futuro!!

Com esta solução ou com outra qualquer, todos juntos, certamente conseguiremos, de uma forma mais ou menos eficaz, ultrapassar este desafio gigantesco que temos pela frente!